quinta-feira, 21 de maio de 2015

Malu, a estressada



Malu sempre foi estressada. Desde quando era Maluzinha, sua mente ansiosa estava à frente, impedindo-a de estar de fato onde devia no momento. Nas brincadeiras, entregava- se durante os dois primeiros minutos, em média. Depois, começava a confabular, encontrava até chifre em cabeça de cavalo e estragava a diversão. Logo acusava o amigo que queria trapacear, o irmão que não sabia jogar, lembrava da mãe que iria brigar porque ela estava se demorando além do previsto. Cresceu com a feroz ansiedade como companheira e o estresse era característica bem lembrada por todos de seu convívio.

Quando estava mais entendida, passou a identificar gatilhos para seus estresses e algumas válvulas que lhe faziam fugir das crises. O fora do namorado pedia chocolate. Aos montes, sem pena. Uma descarga de dopamina para esquecer o galinha safado que não merecia sequer habitar o mesmo planeta que ela. Conflitos familiares eram amenizados com roupas novinhas, compradas somente por impulso e pela sensação reconfortante de passar o cartão na maquininha e carregar montes de sacolas. E, claro, para crises de grau altíssimo, sempre havia eles... os sapatos. Pares e pares, amontoados no armário. Às vezes, quando batia uma leve culpa, ela lembrava que não eram apenas sapatos. Eram recompensas, alívios para todo o sofrimento por que já passara um dia.

Assim, ela vivia ciclos: um gatilho qualquer, estresse e ansiedade, um mecanismo para combatê-los, alívio momentâneo e, não tardava, tudo novamente. Cíclicas eram suas crises, assim como as "terapias alternativas super eficientes" (nos termos dela), que descobria para enfrentá-las.

Começou com aulas de dança. Alguém disse que dançar era um ansiolítico natural, sem contraindicações, de efeito terapêutico imediato, além de favorecer o convívio social. Matriculou-se em um curso de balé. Nunca havia feito balé quando menina, mas, na companhia de uma amiga, resolveu aventurar-se nos pliés e jetés da dança. A empolgação durou três semanas, até ela torcer o tornozelo em um passo mais arriscado para sua categoria iniciante tardia, o que a fez pendurar, para sempre, as sapatilhas.

Resolveu mudar radicalmente e, dos collants e sainhas, passou às pesadas luvas. O boxe era a terapia da vez. Parecia um excelente meio de descarregar as tensões acumuladas durante o dia. Saiu do trabalho com seu par de luvas recém-comprado, seus shorts especiais e foi à primeira aula. "Dar porrada" devia ser mesmo legal, pensou. Só não tinha ideia do quanto o esporte iria lhe exigir. Depois de derramar litros de suor no primeiro treino, começou a sentir torpor, a visão turva e o ar parecia faltar-lhe. Não lembra o momento em que quase foi ao chão. Ela só recorda que, ao despertar, rodeada de alunos, tinha sua luva apoiando a cabeça, cuidadosamente colocada pelo seu instrutor após o susto. Saiu da sua primeira aula morta de vergonha e nunca mais conseguiu retornar.

Depois vieram as aulas de yoga. Que ela, também, não conseguiu levar adiante. Muito zen, dizia a quem perguntava. Pilates, musculação, dança do ventre. Aulas de inglês, francês, espanhol, alemão. Aventurava-se em todas, mas não chegava a concluir nenhuma língua. Resolveu, então, que precisava era de adrenalina. Esportes radicais. Slackline, canoagem, bodyboarding, escalada, montanhismo. Fez de tudo. Perdeu muito do medo que tinha, mas a ansiedade não resolvia deixar-lhe.

Foi para o campo das artes. Desenho, aulas de canto, violão, saxofone. Descobriu talentos que sequer imaginou ter. Já podia tentar uma segunda profissão, pensava. Mas dormir tranquila em sua cama fofa que era bom, nada!

Então, descobriu algo que parecia ser a cura para sua ansiedade. Tudo bem que foi levada a isso por modinha, mas era tão simples e lúdico, que não sabia como nunca havia tentado antes. Livros de colorir. Tinha alguns livrinhos de atividades de seus filhos em casa, mas nunca se interessou de fato por eles. Até que, passeando por uma livraria, avistou os tais livrinhos para adultos. Foi meio que hipnotizada por eles. Resolveu levar dois, além de uma dúzia de lápis com efeitos especiais. Era fan-tás-ti-co!! Depois de uns dias, resolveu comprar mais livros e também aumentar sua coleção de lapizinhos fofos. O efeito terapêutico estava comprovado. Finalmente, descobrira algo que funcionava para ela.

Até que uma amiga, também recém-adepta da atividade, incluiu-a em um grupo no WhatsApp. Nossa, já existia até grupo de adoradoras dos livrinhos mágicos! Então, a terapia deixou de ser terapia. Passou a ter efeito contrário. Eram disputas diárias de quem tinha mais lápis, quem fazia os efeitos mais bonitos. Sempre havia aquela com a maleta mais cara e mais cheia dos melhores lápis. Aquela que dava às gravuras um colorido profissional. A que postava fotos tão perfeitas, que levantava suspeitas sobre sua autenticidade. A que mais parecia incorporar um pintor expressionista. Malu não se sentia à altura das amigas/rivais. Céus, aquilo ia deixá-la louca!

Até que ela encontrou o meio de impressionar. Já não se tratava de desestressar, mas de sentir-se pertinente e adequada, como um adolescente à procura do seu grupo. Precisava mostrar àquelas mulheres que, sim, ela era boa também. Até melhor que elas. Tirou a foto e postou. Logo começaram a soar os bipes das mensagens felicitando-a, a inveja em forma de cumprimentos. Ela se sentiu vitoriosa, o gosto agridoce da soberba deliciava-se. Ria-se, orgulhosa e trapaceira, admirando o livro aberto na gravura colorida, de forma escondida, pela filha de sete anos. A única que, naquela casa, no momento, experimentava de verdade o poder lúdico e curativo daquelas páginas.

domingo, 10 de maio de 2015

O maior amor do mundo


Texto especial para o Dia das Mães. Parabéns a todas as mães!



A gente sempre ouve por aí que amor de mãe é incondicional. Eu não tinha muita noção do que era isso, repetido aos ventos como um mantra. Pelo menos até ser mãe.

Antes de ser mãe, tudo que ouvia a respeito da maternidade parecia meio exagerado. Hoje sei que não é. Nossas mães costumavam dizer: "quando você for mãe, vai entender". Mãe, você estava certa: hoje, eu entendo. Antes de me tornar mãe, tinha uma ligeira noção disso tudo. Sentir de verdade, só passei a sentir quando fui mãe.

Se alguém me dissesse, há alguns anos, que a minha vida iria se transformar completamente, eu poderia até imaginar: horas de sono perdidas, menos tempo para mim mesma, preocupações com uma vida sob minha responsabilidade etc. Não imaginava era o tamanho e profundidade das mudanças que a maternidade iria operar em minha vida. Posso dizer, sem medo de parecer meio brega, que ser mãe é experimentar o maior amor do mundo!

E, quando a gente é tocada por esse amor, a gente se transforma. A lagarta vira borboleta. A vida ganha um colorido especial. Quando estamos no papel de mãe, é como se apresentássemos ao mundo nosso melhor lado. Não que a maternidade seja um mundo cor-de-rosa, intocado, perfeito. Tudo isso a gente descobre, no dia a dia, que não é. Porque, antes de sermos mães, somos humanas. Sofremos, erramos, aprendemos. Compreendemos melhor os nossos pais. Perdoamos. Tornamo-nos mais empatas. Passamos a entender melhor o tal do "amor incondicional".

Descobrimos o amor pelos nossos filhos (ah, esse é fácil!). Mas, além disso, descobrimos o amor por cada filho e por cada mãe. Sorrimos com os filhos de outras mães. Choramos por esses filhos e, mais ainda, choramos por essas mães. Porque a dor de uma mãe não é dela, apenas. É de todas. É como se todas as mães estivessem unidas por essa espécie de sentimento mágico.

Nossas prioridades mudam depois que a gente é mãe. Porque nossa vida e nosso tempo já não  são só nossos. A gente descobre o quanto a infância de nossos filhos passa rápido. Que nada se compara a acompanhar os primeiros sorrisos, os balbucios, os primeiros passinhos, as descobertas. Que sentar juntos para fazer dever de casa é um aprendizado maravilhoso. Para eles e, especialmente, para nós. A gente dá valor a cada beijo de despedida na escola, pois logo eles irão crescer e terão vergonha disso.

A gente se sente importante de verdade. Porque, para nossos filhos, somos referência. O que dizemos a nossas crianças é como uma verdade absoluta. Por isso, aprendemos a nos policiar mais. O que dizemos e fazemos a nossos filhos será determinante para eles.

Aprendemos a administrar melhor nossos anseios e culpas. Sentimo-nos mais leves quando tiramos dos ombros o peso da culpa que o mundo aprendeu a jogar sobre as mães. Descobrimos, pela experiência, que não precisamos ser heroínas nem polivalentes, mas acabamos sendo um pouco disso mesmo assim.

Fazemos nossas preces em silêncio. Pedimos mais tempo nesta terra para passar com nossos filhos. E, mais que isso, suplicamos mesquinhamente que jamais um filho parta antes de nós. Porque, apesar de sabermos que eles não são nossos, apesar de tê-los carregado no ventre, nos braços e para sempre no coração, queremos ter o aconchego deles por perto e, não, não queremos experimentar a dor de ver um filho partir.

Passamos a apreciar as horas juntos, os sorrisos e silêncios compartilhados. Porque podemos passar horas entretidos, cada um com suas atividades, mas sabemos-nos juntos. Aprendemos a conviver com as diversas emoções (muitas vezes diametralmente opostas) que a maternidade proporciona. Encontramos paz na agitação, disposição mesmo quando o corpo se sente esgotado e força onde sequer imaginávamos existir.

Quando a gente se torna mãe, a gente experimenta um pouco do maior amor do mundo. E isso nos torna mais especiais. Hoje entendo quando dizem que mãe é meio sagrada. Não porque deixamos de ser humanas, mas sim porque provamos do amor que, com certeza, vem de Deus.

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